quarta-feira, 6 de junho de 2012
RIO PARAGUAI
Rio Paraguai tem boa saúde ambiental /
O Rio Paraguai, em Corumbá, e ao longo de toda a Bacia do Alto Paraguai, apresenta, ainda, uma boa qualidade ambiental ou “saúde ambiental”. A constatação é da bióloga da Embrapa Pantanal, Débora Fernandes Calheiros, que há 17 anos desenvolve pesquisas relacionadas à Ecologia de Rios e Áreas Inundáveis na região. Entretanto, ela afirma que suas pesquisas já indicam a presença de níveis diferenciados de contaminação por coliformes fecais (presentes nas fezes humanas e de outros animais de sangue quente) resultante do lançamento de esgotos domésticos, metais pesados, pesticidas, e fertilizantes químicos nas águas do principal rio pantaneiro e de seus afluentes.
A pesquisadora, junto com uma equipe de trabalho, realiza a análise da qualidade da água, avaliando a influência da hidrologia do sistema (pulsos de seca e cheia na região), um dos principais fatores que regem a ecologia do Pantanal, trazendo os nutrientes, alterando as características físico-químicas e a composição biológica (o plâncton; zooplâncton e fitoplâncton, que flutuam e servem de alimento para os peixes) das águas para avaliar o estado de “saúde” ou “não-normalidade” de águas dos rios e baías. Os estudos ainda analisam a composição das espécies que vivem nos sedimentos dos fundos dos rios e lagos da região que também são alimentos para os peixes.
O grupo de pesquisa em Limnologia da Embrapa Pantanal, tem realizado o monitoramento da qualidade das águas em mais de 20 rios de toda a Bacia, desde Cáceres, em Mato Grosso, até Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul, e ao longo do rio Paraguai. Os resultados auxiliam na avaliação da entrada de nutrientes, seja de forma natural ou pela ação do homem (via uso de fertilizantes), de pesticidas (“venenos da lavoura”), do material em suspensão – solo exposto e sem a proteção das matas ciliares levado nas enxurradas para dentro d’água – que acabam agindo para o assoreamento (entupimento) gradativo dos rios.
Pelo fato do rio Paraguai ser um rio “relativamente grande” ele ainda tem condições de “incorporar” os nutrientes (provenientes de esgotos e do uso de fertilizantes, por exemplo) e utilizá-los como energia para o sistema. As grandes distâncias entre as aglomerações urbanas como Cáceres, Cuiabá e Corumbá, permitem a “autodepuração” das águas minimizando as alterações feitas pelo homem, observou. “Ainda é um rio que apresenta qualidade ambiental porque os seus processos ecológicos estão mantidos”, ressaltou. Mas Débora Calheiros alerta: “À medida que o poluirmos cada vez mais, tais processos passarão a ser alterados, a capacidade de se autodepurar diminui e o rio começará a ficar debilitado, da mesma forma que ocorre com a saúde de uma pessoa. O Rio Paraguai ainda comporta, por exemplo, os esgotos de Corumbá, Ladário e das cidades na fronteira com a Bolívia. Mas até quando?”, observou e questionou a bióloga.
Embora o rio Paraguai apresente ainda a chamada “saúde ambiental”, a pesquisadora alerta para a preocupação com a sua conservação. “À medida que a população aumenta, a poluição por esgotos irá aumentar, o ideal é prevenir para que não se contamine o rio”, salientou ao lembrar que o rio Paraguai recebe carga de uma aglomeração populacional de cerca de 150 mil pessoas, ao se incluir todas essas cidades na região de Corumbá.
Coliformes e pesticidas
Débora Calheiros relatou que trabalhos da Embrapa Pantanal acusaram a existência de contaminação do rio Paraguai por coliformes fecais (provenientes das fezes), nas áreas dos portos corumbaense e ladarense. “A contaminação é maior nestas áreas de remanso, onde a água é mais lenta. No canal principal isso não acontece porque o rio flui rapidamente e os nutrientes fecais são incorporados ou utilizados na cadeia alimentar (bactérias, plâncton e peixes, por exemplo) do sistema. Mas isso se torna preocupante, pois estas áreas são áreas de lazer e pescaria, expondo às pessoas a doenças”.
Uma das soluções sugeridas pela bióloga seria, em curto prazo, a construção de um emissário de esgoto que lançasse os nutrientes “mais para dentro do rio e não na borda”. Contudo, em médio e longo prazo ações efetivas de saneamento básico, com implantação da rede de coleta e do tratamento de esgotos, são primordiais. Outra preocupação, dentro dessa conjuntura, é com os córregos urbanos da região, que se encontram em situação degradante de poluição, com esgotos, lixo, animais mortos, e entulhos. “A água é primordial para a vida e para a sustentabilidade do planeta, e nós a estamos desrespeitando profundamente”, destacou.
O uso de pesticidas (herbicidas, inseticidas, fungicidas) já causa contaminação nos rios formadores da Bacia do Alto Paraguai que drenam para o Pantanal. Estudos realizados desde 2000 pela equipe da bióloga, em parceria com a pesquisadora Eliane Dores, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), já apontaram a presença desses compostos. “Os índices ainda não são altos, mas o simples fato de terem sido detectados indica que estão no sistema. A toxicidade dos compostos utilizados na região é crônica, afetando os organismos lentamente”, ressaltou. Segundo ela, esse tipo de contaminação pode comprometer, por exemplo, “a reprodução dos peixes, por afetar negativamente a fertilidade de machos e fêmeas”.
Contribuiria para evitar um quadro desastroso para a Bacia, o simples “respeito à legislação e a utilização das boas práticas agrícolas, com o uso responsável dos recursos naturais, solo e água, de acordo com as normas ambientais”. A conservação das matas ciliares e das nascentes, a implantação de curvas de nível; o uso de fertilizantes e pesticidas em bases técnicas e evitar ou diminuir os desmatamentos são ações, que segundo ela, ajudariam o Pantanal a resistir à ação agressiva do homem. Segundo a ONG Conservação Internacional, o desmatamento já atingiria a faixa de 17% do Pantanal e, se seguir a progressão, o desmate completo da planície aconteceria em 45 anos, informou.
Desenvolvimento
Os projetos de desenvolvimento para a região, como a implantação de usinas de álcool – que foi barrado pela Assembléia Legislativa – bem como o de usinas termoelétricas e de pólos siderúrgico e gás-químico têm alto potencial de elevar os índices de poluição da água, do ar e do solo nas regiões envolvidas, e esta poluição pode se espalhar rio abaixo, esclareceu.
“Estamos no coração do Pantanal e temos que nos preocupar, pois cada vez mais estamos ameaçando a saúde ambiental desse ecossistema e, principalmente, a nossa saúde e a nossa qualidade de vida. O lado negativo desses projetos deve ser informado para a sociedade e com direito a ampla discussão”, afirmou a bióloga.
Débora Calheiros frisou que o rio Paraguai que ainda tem “certa qualidade ambiental”, suportando alguns impactos das atividades humanas, pode ter a “vitalidade” comprometida com o aumento da quantidade e da qualidade desses impactos. “Aos poucos, vamos minando a saúde do sistema. Nos últimos dez anos os processos de degradação se aceleraram e a situação se complicou em toda a Bacia”. A pesquisadora acredita que o ideal seria “um mutirão, uma força-tarefa” para conservar o Pantanal. “Todos temos que dar nossa parcela de contribuição e de responsabilidade, mas precisamos também da vontade política”.
Outros impactos
Há outros impactos que afetam a manutenção da dinâmica das águas na região, de acordo com avaliação de Débora Calheiros. No rio Paraguai, a navegação irregular provoca a batida das barcaças nas margens causando desbarrancamento e aumentando o assoreamento do leito. Na Bacia, além das barragens para a geração de energia em Usinas Hidrelétricas já existentes, em Mato Grosso, estão previstas mais 46 usinas, entre pequenas e médias. Esta série de barragens tem, em conjunto, o potencial de alterar o pulso de inundação do rio Paraguai, o principal rio do Pantanal.
“O pulso de inundação rege o sistema Pantanal, e os impactos ecológicos e econômicos decorrentes de sua alteração são imprevisíveis. Ele também é um dos fatores que mantém a produtividade pesqueira da região, na qual se baseiam duas das principais atividades econômicas da região, a pesca profissional e o turismo de pesca”, concluiu.
Fonte: Marcelo Fernandes
Correspondente do Jornal Correio do Estado e do site Corumbá on-line - matéria extraída do site www.corumbaonline.com.br - 22/03/2006
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